Recentemente tive acesso às justificativas de bateria do carnaval carioca de 2012. Após lê-las por completo, e compará-las com as do carnaval de São Paulo, me senti motivado a escrever sobre as diferenças de critério em cada um dos carnavais. A dúvida inicial da maioria das pessoas que acompanham baterias é: Por que os jurados do Rio atribuem tão poucas notas 10? Será que são os jurados de SP que são menos rigorosos? As baterias do Rio estão piorando e as de São Paulo melhorando?
Pelo segundo ano consecutivo, nenhuma das baterias das escolas cariocas teve somente notas 10 dos jurados. Em 2010, apenas a Imperatriz Leopoldinense conseguiu tal feito. Ao mesmo tempo, em São Paulo, desde 2006, todo ano temos pelo menos 3 escolas agraciadas com nota máxima em bateria. Qual(is) o(s) motivo(s) que gera(m) essa diferença?
O que eu vou buscar desenvolver nesse texto é o quesito criatividade, amplamente explorado pelos jurados do Rio de Janeiro. Você pode conferir aqui as justificativas de 2012 dos jurados de bateria do Rio. Observem quantas agremiações perderam décimos única e exclusivamente por falta de criatividade. O primeiro jurado descreve, em suas observações finais, a maneira como adota e julga esse critério: "A justificativa de falta de criatividade atribuída a alguma escola siginifica a comparação com outras que apresentaram (em frente ao módulo) convenções ou levadas mais elaboradas e com maior grau de dificuldade".
Podemos concluir daí que é um critério fundamentalmente comparativo e que depende muito da percepção do jurado. Baseia-se na complexidade das paradinhas, na ousadia e no efeito que provoca. Por ser um critério mais subjetivo, esse julgamento não deve se sobrepor aos principais pontos a serem avaliados em uma bateria durante o desfile, como sustentação, equilíbrio de naipes e precisão nas retomadas. Um exemplo de bateria carioca que ganhou em criatividade em 2012, claramente foi a Mangueira, com 3 notas 10 após executar a "paradona" que emocionou a todos os espectadores.
A "paradona" da Mangueira não teria qualquer efeito sobre a nota, caso fosse executada no Anhembi. Veja trechos extraídos do Manual do Julgador do Carnaval de São Paulo: "A bateria é o “coração de uma agremiação”, que mantém o vigor e a cadência indispensáveis para o desenvolvimento do desfile da agremiação, dando sustentação ao canto...". "A criatividade de cada Bateria NÃO SE DISCUTE, uma vez que ela é uma concentração popular eclética na sua formação, com a participação das mais diferentes classes sociais e culturais do nosso País. Sendo assim, cada entidade tem o direito de fazer o que bem entender nos seus desenhos rítmicos..."
Reparem que a desconsideração da criatividade é prevista em regulamento. Isso leva a mudanças na forma de se pensar a bateria para o desfile. Mestre Moleza, por exemplo, em depoimento feito ao Blog Bateria S/A, disse que um dos motivos que levou a Puro Balanço à nota máxima em 2012 foi, nas palavras dele, um "arroz-e-feijão bem feito", e também um "trabalho feito com o regulamento embaixo do braço". E ao passar pelo segundo módulo, durante o tempo em que ficou parada no recuo, a bateria da Mancha Verde praticamente não executou bossas, exatamente por "jogar com o regulamento embaixo do braço". Preferiu garantir a nota a ousar na frente do jurado, correndo risco desnecessário de atravessar em algum breque. Fosse no Rio, sua escola certamente seria penalizada.
Não estou aqui defendendo nenhum ponto de vista. Meu objetivo é buscar uma explicação para a diferença nas notas atribuídas em SP e RJ. O julgamento no Rio é, em geral mais rigoroso. Pode-se observar em cada justificativa, uma explicação detalhada para cada décimo tirado. o que não ocorre em SP. E a necessidade de se avaliar a criatividade de cada bateria só reforça esse maior rigor e aparece como uma das principais causas para as diferenças na avaliação.